Saturday, July 21, 2007

"A coisa fica séria, é como um turbilhão, fazendo uma miséria no meu coração"

Hoje eu perdi o ônibus de novo. Ele passou a alguns metros na minha frente, mais ou menos um minuto antes que eu chegasse à parada. Daí fiquei frustrado, pois o próximo so ia passar uma hora mais tarde. Então resolvi caminhar em direção ao meu destino, passando por uma ruazinha, que é como se fosse um pequeno bairro Brasileiro, chamada Medford Street. Pegaria o ônibus lá mesmo.

Levou uns vinte minutos para chegar até lá e quando cheguei, imediatamente ouvi as duas músicas mais bonitas que eu já ouvi na minha vida: "Não fala de Maria" e "Minha gente," ambas de Chico Buarque. Sentei-me num banco pequeno para esperar o bus e nossa, que tristeza profunda e absoluta, aquela que a gente confunde com o amor, que aperta o peito no lado esquerdo. O coração bate milhares de vezes todos os dias, mas raros são os momentos nos quais a gente realmente sente e repara aquelas batidas. Igualmente raro é algo que nos faz sentir o nosso próprio fôlego...Aquelas coisas que nos dão a vida são tidas por já entendidas, são subestimadas, e no processo varridas para longe, postas de lado. Tudo na minha vida é uma fantasia? Que lado, este que estou vivendo aqui nos Estados Unidos ou aquele que vivi mas ainda faz parte indispensável de mim no Brasil? Porque passo entre os dois num segundo, é só atravessar a rua, seja ela física ou mental ou da alma. Todas essas ruas provém de direções diferentes e deveria ter um lugar aonde todas elas se cruzam de uma vez, onde pouquíssima gente já chegou. É realista amar ou viver, quando o amor vem e faz com que tudo que existia anteriormente na vida se torne irrelevante?

A vida anda e desenrola-se como uma história escrita, com palavras que vacilam até que caem no papel. Mas de repente vem o amor a riscar tudo que já estava escrito. Chegou a hora de mesmo rasgar aquela folha e a jogar fora, pois é a hora de começar novamente do nada. Assim é o renascer, o reviver que traz o amor.

Quando eu me sentei naquele banco as escamas foram tiradas dos meus olhos. Por alguns momentos senti como se eu tivesse cem anos de idade ou mais. Eu me imaginei, muito bem me vi como um daqueles velhinhos no Rio ou em alguma outra capital Brasileira, que passam agradavelmente as horas do fim da tarde de suas vidas, passeando pela cidade e observando todas as mudanças e rostos novos. Ou talvez sentados num banco na beira do mar, imersos em ondas de meditação e lembrança.

Olhei para o outro lado da rua e um pouco para cima e vi umas árvores bem altas, densas de folhagem, um verde vivo. Pela sua altura e cor pensei que fossem mangueiras, e depois, de saudade pura mesmo, palmeiras. Enquanto as observava, parecendo-me um jardim com uma camada de copas, apareceu uma gaivota do nada, voando nobremente pelo ar de asas espalhadas, até vir pousar num poste de luz, me lembrando que eu estava no meio da cidade. Somerville, subúrbio de Boston, fica várias milhas de distância do mar ou de qualquer praia. Parecia que a gaivota fora levado pelo vento. Dava para ver que ele estava muito perdido. Ele pulou do poste depois de olhar confuso em todas as direções—sua nobreza tornou-se rapidamente em espanto—e começou a voar para lá e para cá, muito confuso, a única certeza sendo que ele estava buscando a sua casa. Subitamente a gaivota deu mais um salto pelo ar, bateu as asas com força suficiente para compensar por sua confusão, e voou com o vento, saindo tão rapidamente o quanto tinha aparecido.

Eu pensei que isso fosse o fim da história, mas de repente vi algo inacreditável: outra gaivota um pouco menor do que a primeira, pois esta era fêmea. Era sua amada. Os dois voavam, até tínham se perdido juntos, muito longe do mar. Agora ela pousou sobre um tijoulo de esquina de um prédio e olhava para o céu. Parecia que o primeiro tinha voado embora, partindo sem a sua amada, mas de uma forma dava para perceber que eram inseparáveis... Ele mostrou-se bem confuso ao voar sozinho. Sem ela, ele tinha perdido o rumo. Quando ele se foi e a amada surgiu na minha vista, ela parecia mais resoluta, como se ela soubesse que estariam reunidos ou no ar ou no seu lar, ou de volta perto do mar: o quando da questão não faria diferença. Parecia que ela estivesse deixando o companheiro dela voar sozinho por um tempo, até completamente confuso, para que do meio da conturbação ele achasse o caminho verdadeiro: é ela.

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